Um dedo de prosa no banco da praça
Gosto de chegar na terrinha, me sentar em um dos bancos do
jardim e, além de ler meu jornal de cada dia, esperar por um companheiro que
passa, um amigo que senta, um desconhecido que puxa prosa ou até mesmo uma
criança que chega ao Rink me chama a atenção. Sou destes que vê o seu passado
em qualquer pedaço daquela praça, que muitos dizem ser meu ponto principal da
minha Miracema.
Dias destes, bota um bom tempo nisto, quem sentou ao meu
lado foi o Eduardo César Machado Amaral, falando assim, nome completo, você
será capaz de não saber quem é o personagem citado, mas se seu disser que é o
Piazza, professor de educação física, meu parceiro de Tiro de Guerra e dos
times da cidade, você fica sabendo na hora e vai me ilustrar com um monte de
causos do professor. Certo?
Certo. Ele, Piaza, gosta de relembrar os bons momentos daquelas peladas do Rink, do Ginásio
Miracemense, e, certa hora, o velho amigo parou, olhou para o alto, deixou a
respiração vir com calma e me perguntou: - Você sabe alguma coisa sobre o
Hamiltão? (Hamilton Damasceno), que nunca mais apareceu após ser sequestrado
pelos homens da ditadura?
Ao receber a resposta negativa Piaza emendou: - Era um
amigo, meu vizinho de frente e bom parceiro nas peladas aqui do Rink e lá do
Ginásio,você também viveu estes momentos, mas como era encrenqueiro, tretou e
rolou ele acabava com a brincadeira com uma confusão arrumada para que seu time
não perdesse, disse Piaza soltando uma bela gargalhada, daquelas que você já
conhece dele.
Em agosto do ano passado, em Niterói, no encontro promovido
pela dupla Hércules Salles e Marista Felix Linhares, me encontrei com o
Valzenir e novamente o papo foi o Rink, o Hamiltão e outros personagens,
companheiros do Valza nos jogos de baleba, de finco e das intrépidas peladas do
Rink, que por sinal o Valzenir era fera em todos estes tópicos, um craque com a
bola pesada e com as bolinhas de gude.
E o Rink tem muitos heróis,
uns anônimos outros famosos, como
Miguel Prescura, artilheiro matador, o terror de Luxo, o goleiro oficial
das peladas, e o Zé Bolão, um dos grandes goleiros de Miracema, principalmente
no Futebol de Salão, onde se destacava com mérito e entrou na galeria dos
famosos.
Era uma época de ouro do Futebol de Salão, os campeonatos
esquentavam as noites e às tardes eram reservadas para peladas de alto nível,
que tinha plateia garantida nos muros e os craques, como Júlio, Thiara, Scilio
Filho, Faustino, e alguns outros, que como eu, tentava entrar no ritmo das
feras e quando não tinha lugar garantido ia para o gol para poder participar da
brincadeira.
Na minha memória vem um time dos bons, era tão bom que eu
não tinha lugar na linha e sim no gol, Gilson, David, Tiara, Cacá e Júlio formavam
os caras da linha e eu ali atrás tentava segurar o placar que eles construíam e,
quando arrumávamos um para ir para o gol, minha hora de buscar as redes
chegava, mas isto era só nas peladas, nos jogos eu tinha mesmo que me contentar
com a camisa um, que ninguém queria e ninguém a tirava de mim.
E o Piaza continuou a prosa até a chegada do Sabiá, guardião
do jardim, que queria saber como eram os bons tempos da nossa infância e como
ele poderia fazer para que o jardim tivesse o mesmo brilho e intensidade do
movimento do nosso tempo. E a resposta foi rápida e quase em dueto: Nosso tempo
era mais fácil, não tinha internet, não tinha televisão e nossas brincadeiras
eram todas por aqui, neste jardim espetacular e com tantas histórias guardadas
em sua memória.
Comentários