DE PAI PARA FILHO UMA PAIXÃO PELO FUTEBOL

Na década de 80, quando o Botafogo amargava um longo jejum de títulos, Arthur, meu cunhado, sofria com a eliminação de seu time. Um belo dia virou para o pai e disse: "Agradeço ao senhor tudo o que tem feito por mim. Pela minha formação, minha educação, mas não posso lhe agradecer pelo time que você me influenciou a torcer e que há muitos anos só me faz sofrer". Logo depois desse desabafo Arthur ficou triste, foi uma das raras vezes (ou a única) que ele viu o velho Olavo com um olhar triste em sua direção. Ele não respondeu, mas pelo olhar de decepção a resposta estava dada.
”Agora, mais maduro, entendo o seu comportamento. Lembro-me perfeitamente todo o tempo que meu pai perdia falando de futebol comigo e a paciência de discutir o que estava escrito nos jornais. Até hoje, depois de qualquer jogo eu me pego lembrando e ávido para ele para comentar a partida, mas ele está longe, em outra vida e de lá só pode ouvir as minhas lamentações”, diz meu cunhado Arthur.
O Silvinho, primo, outro botafoguense de quatro costados, envia-me um e-mail em resposta ao assunto acima, comentado por mim com amigos da grande rede. “Primo, o esforço que meu pai fazia para que eu gostasse de futebol ainda driblar a minha mãe para que ele pudesse me levar ao jogo no domingo. Até discussões surgiam, pois minha mãe, lógico, no dia que poderia ter a companhia de toda a família, perdia seu filho e marido para uma partida de futebol”.
Agora entendo o esforço desses pais quando tentavam levar seus filhos aos estádios ou, nos tempos modernos, a um bar ou até mesmo à sala de estar para assistirem seus times ao vivo e/ou pela tevê. Lá em casa, onde a liberdade de escolha é total, vejo a rivalidade local aflorar, o Ralph é Goytacaz e no momento está quase perdendo a empolgação com a fase do alvianil, o Leandro é Americano, mesmo sabendo que não verá títulos, sofre nas arquibancadas em jogos do alvinegro.

Em âmbito nacional a situação se complica ainda mais, três filhos e somente um flamenguista, justamente o que viu a última geração vitoriosa do Flamengo. Claro que o mais velho, Ralph, é fã de Zico e cia ltda., tem até fotos com o Galinho e pôster do time campeão do Brasil, da América do Sul e do Mundo. E a menina, Gisele, talvez influenciada pelo Célio Silva, é vascaína e tem no armário umas quatro camisas cruzmaltinas. Já o Leandro bandeou para outro campeão mundial, da América e do Brasil. É São-paulino apaixonado.

Se por um acaso o ideal de sua cria não torcer pelo mesmo clube que o seu, não se desespere. É lógico que se o rebento tiver outra preferência não vai diminuir o amor do pai para o filho. Pense bem, no mínimo você vai ter um outro time para torcer e acompanhar. E, no mínimo, mesmo se o seu time perder, você pode ter a alegria de ver o seu filho feliz. Se você gostar muito de futebol melhor ainda, pois por muitos anos de sua vida você assistirá, sem nenhuma desculpa, o dobro de jogos, sem precisar inventar desculpas para sua companheira.
Veja só o caso do amigo e guru José Maria de Aquino, um dos grandes são-paulinos da história. O seu neto, que ousou torcer pelo arquiinimigo Corinthians, chegou a trocar a camisa tricolor por uma alvinegra, fui intermediário da transação com outro desiludido pai, Célio Silva, cujo filho nasceu corintiano e se debandou para o São Paulo após anos a fio de vitórias do tricolor do Morumbi.
Mas voltamos ao Renato, o neto do Zé Maria. É o próprio avô/coruja quem fala sobre o assunto: “Dei a ele tudo do Corinthians e pedi para que devolvesse as camisas e as fotografias com o Kaká, o que não fez. Depois, naturalmente, vendo as conquistas do São Paulo, voltou a ser feliz. Viu a conquista do tri, da Libertadores, ao vivo, no estádio, o tri do Mundial pela televisão”. Viu só, não devemos forçar nada, deixe a emoção de seu filho fluir normalmente e ele, com certeza, irá escolher bem o seu time do coração. Claro que tudo tem limite, torcer pelo “Curintia” faz mal a saúde, dizem os paulistas.

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