Aos mestres, com carinho

Certa vez, conversando com meu velho amigo João Batista Alves, filho do professor Ulisses Alves, ele me perguntou se eu tinha saudades do tempo de colégio,  eu disse que sim e que até já havia escrito uma crônica falando das minhas professoras e me senti feliz por que recebi, de várias delas, ainda entre nós, felicitações sobre o texto e agradecendo a citação dos nomes delas. 

- Certo, disse João, mas você não contou sobre o tempo do colegial, sobre suas passagens pelo Nossa Senhora das Graças e Miracemense, não tem saudade de seus professores daquele tempo? 

Claro que sim, e muitos deles me proporcionaram boas lembranças e tenho, praticamente, uma história para cada um destes mestres que deixaram seus nomes na história da educação miracemense, mas antes, lembrando aos amigos que tive também uma temporada estudando em Pirapetinga, no colégio de lá, levado pelo seu diretor, João Domingues, por ter tido problemas na minha cidade natal. 

Entrei no ginásio em 1962 e tive bons professores, como José Maria Machado, um homem culto, inteligente e totalmente voltado para educação da juventude miracemense, foi meu professor de inglês e em suas aulas, para entendermos melhor a língua de Shekespeare. o pensador e escritor da terra da rainha, e quantas músicas aprendemos na língua original e isto me deixa até hoje com uma pronúncia até certo ponto audível nas minhas viagens pelo exterior. 

Me lembro bem do professor Darcy Aníbal, que depois se tornou meu amigo e meu irmão fraterno. Seu Darcy, assim o chamei por muitos anos, foi professor de desenho da minha primeira turma e seu silêncio quebrava nossa bagunça e sua postura transformava toda a movimentação em atenção a sua aula e a sua presença física. Um mestre que deixou saudade e, como José Maria Machado, um dos incentivadores da cultura e das artes. 

Bate a saudade quando lembro do professor Álvaro Lontra e suas aulas de geografia, minha mãe cobrava demais minha atenção e um dia eu cheguei à casa e falei que teria prova oral com o Seu Álvaro, minha irmã, Eliane, chamou mamãe e disse para me fazer decorar três pontos passados porque o professor gostava disto e a prova seria assim. Escolhi um e coloquei na ponta da língua, e, por sorte, este foi o escolhido. Nem precisa dizer que ganhei 10 e um elogio do mestre Álvaro Lontra. 

Só para completar meu pensamento sobre este grande mestre conto aqui uma passagem do professor Álvaro Lontra, que gostava de colocar para fora de sala aqueles alunos que o irritavam com conversa ou bagunça. 

Certo dia, na chamada, acredito que ele estava "virado" e ao ler os três primeiros nomes da ele mandou: - Adilson Picanço Dutra?  eu disse presente, e ele, "fora". Antonio David Resende? Presente, gritou David, "fora", mandou o mestre, Antônio Miguel Anselmo Miranda? Presente. "Fora", arrematou seu Álvaro dizendo: "Quem mais quer sair?" Grandes momentos, grandes lembranças. 

E por falar na família Lontra vem a lembrança do outro, o professor Carlos Lontra, meu mestre em português no Miracemense e no Nossa Senhora das Graças e é de lá, no Cenecista, que tenho uma excelente passagem com ele, em 1968, quando eu servia ao Exército Brasileiro, leia-se Tiro de Guerra 217, e naquela quarta-feira tínhamos uma prova e eu não estava preparado para tal. Um sufoco danado, lembra disto Léa Vidal Sales? 

Sai de casa preparado para dar um "golpe" no professor Carlos Lontra, não estudei nada e precisava de pontos para passar sem precisar de nota na prova final, mas como fazer? Pensei bem e vesti a farda do TG, botei o capacete e levei até o sabre para a aula, que era à tarde, com o sol batendo na sala de aula e, como era depois do almoço, eu disse a Léa.

- Vou fingir que estou dormindo e você, por favor, quando seu Carlos passar você diz que estive de plantão à noite inteira e saí de lá do TG só para fazer a prova, combinado? 

A amiga aceitou e só não contava que eu adormeceria de verdade, e, quando o professor Carlos Lontra chegou, dizem que eu até babava, e o mestre ficou com pena de mim e me deixou dormir até quase o final da aula. E então, quando recolhia as provas, me falou. 

- Rapaz, você serve a pátria e merece um pouco de descanso, você precisa ir para casa, dormir direito. 
- E como é que fica esta prova, não fiz e preciso de nota, disse-lhe na maior cara de pau. 

- Não se preocupe, vai levar um dez e nem precisa pedir na secretaria para marcar outra prova para você, admiro o Exército Brasileiro e a bravura dos seus homens.  Bradou o patriota Carlos Lontra. 

E por falar nisto tenho uma outra passagem, com o professor de Contabilidade, Genserico Câmera Castro, o Seu Nézio, grande mestre dos esportes e das matérias sobre a contabilidade, afinal era um baita treinador de basquete e futebol, enxadrista de alto nível e contador respeitado na cidade. 

Seu Nézio era um apaixonado pelo Tupã EC, foi um de seus primeiros treinadores, e eu jogava no time principal, treinado pelo Maninho, e em um dia de prova, não sei se era final ou não, eu me machuquei no treino, tive uma luxação no pulso, e à noite, na hora da prova, enfaixei bem e fui para a aula disposto a não fazer a tal prova, também não estava muito bem preparado. 

Ao distribuir as provas pelas carteiras o professor Nézio viu minha mão enfaixada e perguntou se eu era destro ou sinistro. Eu quase que me dei mal, não sabia o que era sinistro, achei que ele queria saber se eu era perigoso no futebol, para quem não sabe "sinistro" quer dizer canhoto na linguagem correta. 

Mas vamos ao causo, que é o que interessa, e quando eu disse que era destro ele me disse que não precisaria fazer a prova. - Quem joga no Tupan tem preferência do professor, machucou no treino então não precisa fazer a prova, vou repetir a sua nota da prova passada, tá bom? 

Claro que estava, tirei oito na última prova e com mais oito dava para completar os pontos necessários para passar sem prova final, que foi o que aconteceu, poque eu era bom na matéria e o professor ótimo para ensinar, aliás e a propósito, eu sempre o admirei e sempre fui seu pupilo no basquete do Miracemense. 

E são muitos os causos e as histórias sobre meus mestres queridos e admirados, professor Jarbas Pinheiro, homem inteligente e educado, trabalhava muito e quando chegava à noite, nas últimas aulas, a gente sabia que o mestre já estava cansado e puxava assunto sobre Palma, onde naquele tempo eu jogava pelo campeonato da cidade, e perguntava por alguém de lá, que o Inkler me dizia que era amigo dele, e aí, meu caro, o tempo passava e ele, quando percebia, via  a sineta tocar e o tempo acabar. 

E para o final deixei o mestre Ulisses Alves, excelente professor de português, acho que foi ele que me incentivou a ser mais rigoroso com a escrita e a fala em nosso idioma, me cobrava muito e tenho uma passagem interessante com ele, nunca fui aluno de NOTA DEZ, as vezes, no máximo, atingia um oito ou sete, e em uma das provas, no segundo ano ginasial, fiz com perfeição porque não queria repetir de ano mais uma vez, e botei em prática tudo aquilo que estudei com muita intensidade. 

Era prova para um dez, com toda certeza, mas escorreguei em alguma coisa e poderia me contentar com um nove e meio ou nove. E, para minha surpresa e para minha raiva, o professor Ulisses me chamou, dois dias depois, no gabinete. 
- Adilson, diz a verdade, você colou da Teresa Maria, não é mesmo? Sua prova está muito parecica dom a dela. 
- Claro, professor, ela é aluna de nota dez e me ensinou muito nestes últimos dias, se o senhor botar a cabeça para funcionar, dizia eu, vai lembrar que eu lhe pedi para me sentar bem na frente, longe da Teresa Maria e das meninas mais capacitadas do que eu, justamente porque eu sabia tudo e tinha certeza de que faria uma boa prova. 

- Está certo, rapaz, você realmente sentou-se bem longe de todos, me lembro bem, e não tenho o que duvidar de você. Parabéns, continue assim, você tirou nove e meio por uma bobagem apenas, me elogiou o mestre Ulisses Alves. 

Claro o tempo passou e tudo mudou mas a saudade destes caras maravilhosos ainda é muita, principalmente porque não temos mais as suas presenças físicas neste nosso mundo. Um fraterno abraço a todas as famílias dos citados e que todos eles estejam ensinando suas artes no plano superior. 

Comentários

Patricia disse…
Muito legal, vc era quietinho né? Kkkkkk
Adilson Dutra disse…
Muito. Por isto fui pra Pirapetinga.

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