UM PAPO COM O VELHO ESTÁDIO MUNICIPAL
Cara, quando eu te conheci não sabia sequer falar
corretamente, era trazido pelo Nijel ou pelo Alvinho, hoje estou aqui, já
grandão, falando em você, sobre você e praticamente conversando com você, que
durante alguns anos me deu um punhado de alegrias. Alguém falou em tristeza?
Não, jamais fiquei triste ao lado deste velho moço, que está recebendo nova
roupa e se porta como se tivesse novamente poucos meses de vida.
Quantas vezes cheguei aqui solitário, falando baixinho para
você, que um dia seria famoso e jogaria em um grande time brasileiro? Quanta
ilusão. Você não respondia. Ficava calado. Seu silencio parecia prever que nada
disto aconteceria.
Você viu passar por aqui o grande Lauro Carvalho, que
cracaço, o Milton Cabeludo, meu primeiro ídolo do futebol, viu nascer a geração
Rink, lideradas pelo incrível, e gordo, Chiquinho Maracanã, viu nascer o Tupan,
onde o meu velho pai, Zebinho, jogava ao lado de craques como Olavo Cueca,
Noqueta e tantos outros da geração anos 20, não poderia pensar que este pequeno
e teimoso artilheiro teria tanto brilho.
Acertou meu camarada. Futebol foi a sério até o início dos
anos 70, depois disto só batalha para sobreviver e ser feliz em outras bandas.
É cara, você está velho, ninguém jamais revelou a sua idade,
o José Maria de
Aquino deve saber, mas parece que este longo tempo de vida te
fez bem. Muitos destes craques já se foram e você aí, de pé, forte como um
touro e com tanta gente querendo te melhorar, te dar um toque moderno, uma roupa
nova.
Você é um privilegiado, viu alguns jogadores, que se atuassem
nos dias de hoje seriam considerados craques fantásticos ou até mesmo
fenômenos. Você se lembra do Silvinho, do Braizinho, do Frederico, do Edil, do
Ademir, do Júlio, do Chiquinho?
Lembra-se do time do Vasquinho, criado pelos fanáticos
vascaínos Edson e Clarindo? Claro que se lembra, foram estes que brilharam no
período em que o futebol brasileiro tinha jogadores do nível de Garrincha,
Pelé, Zico, Rivelino e tantos outros, por isto ficaram por aqui, brilhando no
terreno doméstico.
Ali em cima, naquela laje que cobre os vestiários, começamos
a conversar via rádio, a nossa Princesinha não foi a pioneira, o Clóvis
Helsinque, com sua turma da Rádio Emissora de Miracema, já havia conversado com
você há alguns anos atrás, mas falar para toda região eu acredito que nós, eu,
Zé Luis da Silva, Chico David, Fernando Nascimento, Paulo Joel e Welington
Ronzê fomos os primeiros, depois vieram os comandados do bom Gelti Rodrigues,
mas levar você a um estrelato jamais imaginado, eu duvido que alguém tenha
feito mais do que a nossa equipe de esportes, que até promoveu eventos, lotando as suas arquibancadas com jogos da Copa Noroeste. Saudades? Claro que sim,
garanto que você também as tem.
É meu camarada, estamos ficando velho. Hoje eu me emociono só
em lembrar que este seu belo gramado já foi destruído por uma Exposição
Agropecuária, em 64, foi uma revolução. Naquele tempo o Campo do América não
era lá grandes coisas e o Ferradurão ainda não havia nascido para te fazer
companhia, e por isto a turminha do time do Bitico brigou pra caramba, mas tudo
bem, o Seu Jamil Cardoso estava bem intencionado e a Exposição pegou e virou
sucesso nacional.
O tempo é cruel, meu caro, quando saí daqui, em 85, eu acreditei
ter plantado uma base para que o futebol voltasse a crescer, mas infelizmente o
Maninho se foi e com ele foram as esperanças de ver novamente você entrar em
ação e nos apresentar belos espetáculos como aquele dos anos 60, quando o
Flamengo veio aqui com seu juvenil extraordinário, Gerson, Beirute e Germano
eram garotos e craques, enfrentar uma seleção miracemense cuja principal
estrela era nada mais do que o fantástico Ademir Menezes, artilheiro da Copa de
50, amigo de Jofre Salim, que o trouxe para nos brindar, pelo menos por alguns
instantes, com a sua magia fenomenal.
Olha, meu caro, por aqui vi coisas incríveis e que se
contadas podem soar como piadas. O Polaca tem um repertório maior e este homem
deveria ter um busto no saguão de entrada desta casa. Imagine você que o Jair
Polaca, o maior futeboleiro da cidade, jamais foi lembrado por isto, talvez
esteja sendo homenageado agora nesta re-inauguração, mas na cabeça e na memória
de todos nós o Polaca será sempre o maior de todos, não por sua bola, mas por
seu amor ao futebol e a seu Miracema FC.
Você me pergunta e eu
respondo, vamos lá, quais são as suas dúvidas e quais foram os melhores que você
já viu nestes anos de amor ao futebol? Vamos lá, não vacile. -Sei não, acho que
não vou entrar nesta sua pilha. Parece que estou ouvindo uma voz saindo do
coração do velho/novo Estádio Municipal. Quando fiz esta colocação senti que
teria uma resposta assim: - Tem tanta gente boa que passou por aqui antes da
sua geração, que prefiro não citar nomes. Eu vi um punhado de gente da melhor
qualidade, que se não forem colocados nesta conversa seria injustiça, e como
seria quando os encontrasse em um plano superior a este?
Tá certo, meu caro, os craques que por aqui jogaram teriam
lugares assegurados na galeria de fotos a ser inaugurada, quem sabe na próxima
festa, logo ali na sua entrada principal. Estou certo de que um dia veremos
esta justa homenagem aos ídolos nativos. Vou indo, já é tarde e falamos
bastante.
Está chegando gente e daqui a pouco irão pensar que estou
louco, alguns até já pensam, mas se me virem conversando contigo irão dizer que
pirei de vez. Um abraço meu velho e bom amigo Estádio Municipal Plínio Bastos
de Barros. Pensei que falava sozinho quando de repente ouvi um sursuro: Vá com
Deus Penacho. Aí, meu caro. Eu chorei.
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