Copa do Chile - republicada a pedidos
Esta copa
teve um grande significado para minha cidade, Miracema, no noroeste do Estado
do Rio de Janeiro. Pela primeira vez eu ouvi histórias de um torcedor
brasileiro presente no local da competição, Seu
Felisberto, um abastado comerciante da cidade, viajou para o Chile para ver de
perto o escrete canarinho, que tinha entre suas estrelas vários jogadores do
Botafogo, paixão do Seu Felisberto. Garrinha, o grande ídolo, estava em grande
fase e por isto o conterrâneo gastou um pouco de seu dinheiro para voar nas
asas da Panair do Brasil, como gostava de dizer.
Seu
Felisberto contava que ficou hospedado no mesmo hotel em que estava Elza
Soares, a grande musa de Garrincha, que a visitava praticamente todos os dias
e, claro, eram encontros sempre às portas fechadas e sem hora para terminar.
“Como é que aquele camarada pode atuar tão bem naquela copa”, dizia Seu
Felisberto, que logo depois completava o seu raciocínio sobre o gênio das pernas
tortas. “Também, com um mulherão daquele a sua disposição ele só podia estar
feliz e tinha de tudo para jogar muito”.
Nste ano,
1962, as emissoras de rádio já estavam mais bem equipadas e por ter sido
realizada no Chile, aqui na América do Sul, enviaram mais profissionais para
cobrir o evento e nós, la na nossa Miracema, ouvíamos Waldir Amaral e a Rádio
Globo, claro que ainda naquele velho rádio “rabo quente” esquentado pelo Miguel
Magaldi. Meu avô, dono do bar em frente à prefeitura, colocava sempre as caixas
de som nos mesmos lugares em que eram colocadas na Copa de 58, na Suécia. “É
pra regular, não podemos tirar do lugar as caixas e o nosso rádio”, dizia o
velho Vicente Dutra.
Nas ruas da
cidade, preparavam-se festas para cada vitória, era uma maneira de homenagear o
ilustre miracemense, Aymoré Moreira, treinador do nosso escrete nacional. Seu
João, cunhado de Aymoré, era um freqüentador assíduo do bar do meu avô, mas
durante os jogos ele desaparecia, dizia-se que ele temia ser hostilizado em
caso de uma derrota do nosso selecionado, mas a população não pensava em
derrota, havia muita confiança e a conquista de mais um título era esperada por
todos, pensando em uma visita de Aymoré a cidade trazendo consigo alguns
campeões do mundo. Depois ficamos sabendo que, em Pádua, havia festa para Jair
Marinho, mas em menor escala, já que o lateral era reserva do grande Djalma
Santos e não jogou nem uns minutinhos sequer.
Meu avô
ficou “maluco da vida” quando soube que Pelé não jogaria contra a Espanha, mas
se tranqüilizou quando soube que Amarildo seria o seu substituto. “Se jogar
como o pai ele vai fazer estrago nestes espanhóis de merda”, dizia o bom
Vicente, que sempre falava do tempo em que Amaro Silveira ,
pai do craque da seleção, jogava no Miracema FC. “Era um craque, saiu daqui pra
jogar na seleção brasileira e jogava muito mais do que este moleque ali”,
vibrava.
Voltando ao
seu Felisberto. Eu me lembro de outra história contada por ele, mas que nunca
terminava a narração. “Vocês, meninos, precisavam ver a cara do torcedor
chileno nas arquibancadas, quando o inglês se ajoelhou no gramado para pegar
aquele cachorro que invadiu o gramado no jogo contra a Inglaterra...”, era só o
que seu Felisberto conseguia contar, pois gargalhava de passar mal e ser
acudido por dona Filomena, sua mãe, que temia um infarto do filho, pois se
emocionava demais quando contava estas passagens por terras chilenas.
No final,
vi, pela primeira vez, uma carreata para comemorar um título. O nome de Aymoré
Moreira era gritado e o prefeito da cidade, se não me engano, era o Jamil
Cardoso, fez vários convites para que o famoso miracemense fosse receber uma
homenagem da cidade e da Câmara de Vereadores, mas a frustração durou pelo
menos uns quarenta anos, tempo que a cidade esperou para receber a visita dos
irmãos Moreira, Zezé e Aymoré, que estiveram por lá para assistir a inauguração
do Estádio Irmãos Moreira, da Associação Atlética Miracema, mas jamais
receberam a tal homenagem, a cidade esqueceu que o treinador da seleção campeã
de 62 tivesse nascido por lá, o que acredito ser por culpa exclusiva dos vitoriosos
treinadores, que pouco valor deram à sua terra natal.
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